quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Call of Cthullu - horrores do Mito na sua tela.


Eu não sou exatamente um cara que gosta de jogos muito modernosos, por isso trabalho aqui com pessoas que possuem coordenação motora suficiente para apertar os 458 botões de um X-Box. Mas eu, sob indicação do grande amigo gamer (e colaborador do VN) Adonay Cesar  - que assina como Stafford aqui - instalei no meu note o jogo Call of... Cuxulu? Cutúlu? kuduru?
Ninguém sabe escrever o nome desse jogo. Pronunciar então, é uma tarefa difícil. Então vamos parar de tentar e vamos logo falar sobre call of... xuxulu. 
Esse jogo ficou seis anos sendo produzido por companhias vagabundas que iam à falência uma POR DETRÁS da outra, até finalmente ser portado e lançado pro XBOX e depois ser portado de volta pro PC pra ver se rendia algum gold. DEVE SER por isso que ocupa só dois CDs e não exige máquina rápida demais. Ele foi lançado para X-Box também, e minhas fontes seguras garantem que os jogos do X-box rodam belezinha no X-Box 360, então você pode procurar na sua gamestore preferida.
Esse jogo é... bom, você deve estar se perguntando por que o senhor old school aqui está escrevendo sobre esse game que é de 2006, relativamente novo em comparação às velharias arqueológicas sobre as quais eu geralmente escrevo.
E vou explicar.
ESSE JOGO É FODEROSAMENTE MARAVILHOSO.
É um arcade adventure, só que a parte arcade é um first person shooter (FPS) que usa o engine do MORROWIND, mas mil vezes mais rápido. Traduzindo pro leigo, os gráficos são decentes e é cheio de efeitos especiais de luz.
Tenho uma teoria que a única vantagem real que eu enxergo nos games novos em relação aos antigos, é que nos games novos, com gráficos e coisas maravilhosamente avançadas, pode-se realmente se contar uma bela história, com todas as nuances de um bom filme. Isso me impressiona desde a primeira vez que rodei Silent Hill no meu PSX. E se quer saber, acho que os jogos de terror dos 16 bits eram ridículos, nada assustador, por questões óbvias. Assustar o jogador mesmo só se tornou possível depois do playstation.
Quem discorda, use a caixinha de comentário.
Mas naquele tenso ano de 2006 foi lançado o game Call of Ctchullu The darks Cornes of The Earth , que é um game muito CORAJOSO & ORIGINAL, com várias inovações e decisões bizarras por parte dos programadores. Claro que isso iria desagradar meio mundo, esse bando de caretas que acha que FPS precisa causar ataques epilépticos no jogador de tanta luz tiro bomba granada grito fogo fumaça e movimento.. Mas eu gostei muito e é o melhor que joguei esse ano. E olha que esse ano eu joguei Rayman Origins.
Primeiro, o jogo é honesto e se revela desde o início como um arcade adventure clássico dos anos 90, incluindo a jogabilidade estranha de propósito como parte integrante da experiência. Vejam bem:
Não tem interface nenhuma, o jogo ocupa a tela toda, sem ponteiro de mouse e nada; essa decisão te impede de saber coisas como energia e número de balas, o que funciona muito bem para TRADUZIR FIELMENTE a sensação de estar diante dos HORRORES, porque não tem o que fazer, é melhor se matar logo antes de perder a sanidade e acho que é o que vou fazer depois de terminar este review. 
E também é o que o personagem principal faz logo no início, que a história é contada através do diário dele.
Ops, spoillers.

Outro detalhe estranho: Tu só pega arma quase na metade do jogo, até lá só pode fugir e se esconder dos inimigos; As armas não recarregam automaticamente, tem que fazer isso na mão e elas demoram bastante pra carregar, além de terem poucas balas, pois são armas de 1920; Nada de rocket launchers teleguiados.
Não tem MIRA na tela e é difícil de acertar os inimigos, tem que usar a mira de metal na arma mesmo, de forma mais realista, sendo que ao esticar a arma pra mirar, cansa o braço do protagonista e fica mais difícil ainda. Vamos entender que o físico do personagem é bastante explorado nessa experiência gamística.
Tem umas sequências arcade-adventure puras que lembram os jogos dos anos 80 e começo dos 90; a primeira cena de ação mesmo, quando os sujeitos bizarros de Innsmouth (a cidade macabra onde se passa o game) querem te pegar no quarto de hotel, é incrivelmente difícil (acho que é a mais difícil do jogo), exige altas adivinhações do que fazer em poucos segundos e qualquer erro é tudo de novo. Mesmo assim TRADUZ FIELMENTE a cena descrita pelo Lovecraft na história "Shadow over Innsmouth", em que toda a população de caipiras-deformados-que-na-verdade-são-descendentes-de-deuses-alienígenas-que-moram-no-fundo-do-oceano querem pegar o sujeito (você) que tá fechado num quarto de hotel e vão tentando derrubar as portas enquanto ele (você) vai correndo de um quarto pro outro trancando ferrolhos e pulando pelas janelas. Bom demais, mas como todo o resto do jogo, só fãs do Lovecraft ou dos arcade adventures velhos vão gostar. (Claro que o público é limitado pra caralho, porque além de tudo o fã bitolado demais vai choramingar com o fato de tantas referências gratuitas ao mito e vai achar que trataram tudo com leviandade, afinal, MEU DEUS DO CÉU, AI, AI, AAAAAAAAAI, o cara tem um Unausprechlichen Kulten solto na mesa e só existem SEIS, S-E-I-S volumes no mundo todo, e meu DEUS DO CÉU ELE ESTÁ LUTANDO CONTRA O DAGON COM UMA ESPINGARDINHA, isso não pode!) (O último parágrafo só foi entendido por quem leu os livros do H.P Lovecraft e eu não vou explicar. se vire e comece a ler. A ignorância não é uma coisa muito bonita).
Um ponto marcante também é que os saves são em checkpoints, que é pra tu não salvar toda hora e ficar sem medo de morrer. No jogo você precisa lidar com o fato imediato de que sua morte é só uma questão de tempo.
O detetive que tu controla se fode por qualquer coisa: Se ele cai de uma altura razoável já se quebra todo e sai mancando, e se leva uns dois tiros, já morre. Também pode morrer se levar um tiro e ficar sangrando por falta de curativos. O sistema de cura é através de vários itens no inventário, como talas e fios pra sutura e ataduras, que devem ser colocados na parte do corpo que está ferida. Você decide isso. Cada parte ferida causa um efeito na jogabilidade, tipo mancar ou andar devagar, não poder pular, não poder atirar direito, não enxergar ou ouvir e ir perdendo a consciência, tudo isso representado por alterações interessantes nos gráficos, sons e controles. Também pode aplicar umas injeções de morfina, causando mais efeitos legais. Eu honestamente não saquei muito bem o que a morfina faz, tudo o que se percebe é uma viagem muito louca na visão do jogador.
Os efeitos 3D também são usados para complicar (ou melhorar, no meu ver) ainda mais a jogabilidade: Se tu tá em alturas, o som começa a diminuir e a visão fica nublada e começa a ir e vir num efeito muito bom de vertigem, que quanto mais alto tu tá, pior fica. A explicação disso? Seu personagem tem medo de altura. E isso dificulta um monte ao andar por telhados e vigas como tem que fazer em algumas partes. Inclusive se tu fica olhando muito pra baixo pendurado em uma corda ou escada, é capaz até VOCÊ vomitar. Encima do teclado. O miojo que você comeu.
O personagem, também numa tradução fiel da da escrita tosca e divertida pra cacete do Lovecraft, sofre de ataques de viadagen loucura progressiva quando exposto a coisas assustadoras ou às criaturas do MITO, e as reações vão desde alterações de visão à paranóia quando ele fica em lugares muito escuros e apertados e começa a resmungar feito um louco, murmurando que está sendo seguido e que vai morrer, ou começa a carregar e descarregar sozinho a arma, ou ainda pode começar a perder a sanidade e ter alucinações audiovisuais. Se tu exagerar na exposição ao mito e FICAR ENCARANDO UM SHOGOTH ou ficar fechado numa sala onde o Chtulhu é idolatrado, pode rolar uma perda total de sanidade e se tu tiver com uma arma na mão ele vai se matar.
É realmente perturbador, numa sala escura, sem nada acontecendo, e seu personagem (cuja visão você está vivendo na primeira pessoa) começa a simplesmente falar sozinho, do nada, dizendo que "eles estão vindo me pegar, ouço os passos". E não tem porcaria de passo nenhum.
Mas tu já se borra de medo. O jogo é eficiente nisso.

Quanto a história, é principalmente aproveitada de "Shadow over Innsmouth", e não vou entrar muito em detalhes pois os mitos de Cthullu são descritos em vários livros. Mas eu diria que tem um pouco mais de "The Shadow Out of Time" e menos de "Call of the Cthulhu" propriamente dito, mas aparecem muitas outras criaturas, textos e representações do mito e é o jogo que mais tem coisa do mundo do H.P Lovecraft, sendo uma diversão nerd extra ficar reconhecendo os elementos. E se revoltando com o modo como são utilizados gratuitamente, se tu for um fã mais xiita.
Resumindo, você é um detetive que vai procurar por um cara que desapareceu em Innsmouth em 1920 e o cenário é bom demais, com os veículos e armas da época. Tudo muito bem ambientado. A cidade é muito fiel à descrição do Lovecraft, desde os habitantes aos nomes das ruas, e vai explorar muitos outros cenários, como uma refinaria que tem até um Shogoth dando sopa e um barco indo pro Devil's Reef, além do Templo da Ordem Esotérica de Daigon, mas não vou te spoilear mais. Jogue o jogo e leia o livro, se tiver coragem.

As PRINCIPAIS CRITICAS dos fãns sobre o jogo são:

I) O uso aleatório e gratuito de coisas do mito só pra mostrar que é do Lovecraft (Eu não vejo nada demais nisso, tem mais é que extrapolar mesmo, é só um videogame).
II) A jogabilidade dificultada (pra mim tem mais é que ser dificultada mesmo, é de propósito e era assim que os arcadea-dventures funcionavam, além de servir muito bem na atmosfera do jogo).
III)  Não reproduz FIELMENTE DE VERDADE MESMO SÉRIO PRA CARALHO diálogos e cenário de 1920 (o que quero dizer é que a linguagem dos personagens são bastante contemporâneas)
IV) O jogo não reproduz os textos cheios de ADJETIVOS CICLÓPICOS & ESCAMOSOS característicos do Lovecraft. Ok, ia ser divertido pra caralho se fizesse isso. Como também seria justo voltar no tempo e dizer pro Lovecraft que seus textos considerados vagabundos, que não renderam nada pra ele durante a vida e que ele achou que nunca receberiam atenção, acabaram dando milhões pra fazedores de filmes toscos, escritores caça-níqueis, Stephen Kings e editoras de RPG e GANHARAM EDIÇÃO DE CAPA DURA DA LIBRARY OF AMERICA, mas tudo bem.



Os sons são bons, os gráficos são decentes e os efeitos são bizarros e originais e este é o melhor jogo ruim que eu já vi, baseado no melhor escritor ruim que eu já li. Vale demais a pena você baixar uns pdf dos livros e colocar ai no seu tablet. Toda a zoação na jogabilidade funcionou perfeitamente e vou garantir a esta obra 3  polegares estendidos e uma estrelinha de "você brilhou". MAS eu devo ser louco, porque ninguém mais gostou disso. Bom, testem aí e me avisem, mas não me falem sobre desrespeito ao Mito. Porra, todos os filmes e todos os outros jogos que tem algo a ver desrespeitaram muito mais. Em hollywood, qualquer babaca retardado com um Kit de Arqueologia tem um Necronomicon na estante.

Minha avaliação final é que esse jogo é uma excelente e imersiva experiência nos videogames.

O Oscar do Velho Noob vai para a cena com o bêbado no porto. É simplesmente maravilhosa.